Em entrevista exclusiva ao UOL, o governador João Doria
disse que ainda está continua recebendo ameaças de morte, mas vai continuar
defendendo o isolamento durante a pandemia de coronavírus e admitiu adotar
medidas mais restritivas caso a população não cumpra a quarentena.
“Eu luto pela vida. Fanáticos negam a doença. São traidores
do seu próprio povo e do país”, afirmou em resposta às manifestações do último
fim de semana que defenderam a posição do presidente Bolsonaro contra o
isolamento social.
Para que os moradores das favelas e da periferia possam
ficar em casa, anunciou que o governo distribuirá um milhão de cestas básicas
por mês e destinará R$ 42,5 milhões à compra de alimentos para atender os 732
mil alunos em situação de extrema pobreza que ficaram sem a merenda escolar.
Doria não quis fazer uma previsão sobre quanto tempo ainda
vai durar o isolamento.
“Hoje meu maior desejo é chegar o dia em que vou poder
anunciar o fim do isolamento e a volta da rotina normal”.
Abaixo, as respostas que o governador João Doria me mandou
por escrito.
UOL — No último sábado, na avenida Paulista, durante a
carreata contra a quarentena, o advogado Marcelo Pegoraro ameaçou o senhor de
morte. Que providências tomou?
João Doria — Lamentável! Durante o feriado de Páscoa, época
de louvar a vida e o amor ao próximo, este facínora fez um discurso público
ameaçando me matar e invadir a minha casa onde vivem minha esposa e filhos. Já
abri um processo por ameaça e incitação ao crime.
UOL — Como se sentiu ao ser chamado de comunista por
eleitores que votaram na chapa “Bolsodoria”? O que já foi apurado sobre as
ameaças que vem recebendo do “gabinete do ódio” pelo celular?
Doria — A respeito das ameaças que sofri, entramos com
notícia crime pedindo a abertura que inquérito policial, que já foi instaurado.
Os fatos falam por si. De um lado, temos mais de 600 mortos no nosso Estado. A
grande maioria da população entende a gravidade da situação e atendeu ao nosso
apelo para ficar em casa. Profissionais de saúde estão sacrificando suas vidas.
Policiais estão cumprindo o seu dever. Do outro lado, fanáticos negam a doença
e passaram a Páscoa rindo em tom de deboche, enquanto praticavam uma dança
macabra, com um caixão nos ombros. Eu os considero traidores de seu próprio
povo e do nosso país.
UOL — A carreata impediu a passagem de ambulâncias com
sirenes ligadas na Paulista. O que o senhor achou da insubordinação da Polícia
Militar que assistiu inerte às manifestações?
Doria — É gravíssimo não dar passagem a ambulâncias de
maneira premeditada. A Polícia Militar tem tido um comportamento exemplar nesta
crise. Além de arriscarem as suas vidas diariamente, exercem atividade
essencial na linha de frente do enfrentamento da doença e de conscientização da
população. Recentemente, de maneira totalmente espontânea, vários PMs gravaram
vídeos para as redes sociais reforçando a importância de permanecer em casa
durante este período de quarentena, além de tranquilizar a sociedade em relação
ao trabalho de segurança pública que segue acontecendo com eficiência.
UOL — Bolsonaro anunciou no domingo que o vírus já está indo
embora e esta semana o senhor lançou nova campanha publicitária para as pessoas
ficarem em casa. Mandetta disse que o povo não sabe se deve seguir as
orientações do Ministério da Saúde, que defende o isolamento social, ou do
presidente, que quer acabar com a quarentena. Assim o povo fica perdido. O que
fazer?
Doria — A maioria da população tem consciência da
importância de mantermos a quarentena neste momento. Apesar da oposição do
presidente à quarentena horizontal e isso gerar uma mensagem dúbia, a palavra
dos governadores e do ministro da Saúde tem demonstrado mais credibilidade e
mais autoridade do que a do próprio presidente da República, como evidenciaram
recentes pesquisas do Datafolha nesse sentido. A Organização Mundial de Saúde
recomenda o isolamento social como única maneira de controlar a doença. Mais de
70 países adotaram medidas de isolamento que atingiram 3 bilhões de pessoas.
UOL — Como decidir entre ficar em casa e correr o risco do
desemprego ou manter as pessoas trabalhando e correr o risco do disparo de
casos da doença, como já está acontecendo? O que o governo paulista está
fazendo para que moradores das favelas e da periferia possam ficar em
quarentena sem ter renda nem para comprar comida?
Doria — Impossível existir normalidade econômica ao preço da
vida de milhares de brasileiros. O governo do Estado de São Paulo vai continuar
agindo com base na ciência e na medicina. Eu luto pela vida. O princípio que
tem nos tem norteado desde o início é prioridade para salvar e proteger vidas.
Como disse o prêmio Nobel de economia Joseph Stiglitz: “A economia será
devastada se não salvarmos as pessoas”. Salvar as pessoas significa o firme compromisso
de ajudar os mais pobres, aqueles que precisam de alimento e assistência.
Conseguimos a suspensão dos cortes de água, luz e gás neste período de crise
para os mais pobres. Ampliamos o atendimento dos 59 restaurantes Bom Prato para
os finais de semana e feriados, com café da manhã, almoço e jantar. Vamos
distribuir 1 milhão de cestas de alimentos por mês a 4 milhões de pessoas. O
programa Merenda em Casa, da Secretaria de Educação, vai repassar R$ 40,5
milhões por mês para a compra de alimentos pelas famílias de 732 mil alunos em
situação de extrema pobreza da rede estadual. Vamos continuar implantando
programas e ações para ajudar os mais necessitados.
UOL — O prefeito Bruno Covas já levou a cama dele para o
gabinete. O senhor se sente mais seguro em casa ou no palácio? O que mudou na
sua rotina com o coronavírus e as ameaças que vem recebendo dos seguidores do
presidente? Qual foi o momento mais difícil no combate à pandemia? Tem dormido
quantas horas por dia? Continua tomando o seu coquetel de vitaminas?
Doria — Eu me sinto mais seguro fazendo aquilo que sempre
fiz. Cumprindo meu papel como governador de proteger vidas e tomar atitudes
corretas para reduzir o impacto da crise na saúde, na economia e na vida dos
mais pobres. Do ponto de vista pessoal, não alterei a decisão de continuar
residindo na minha casa. Mas ampliei a proteção aos meus filhos e à minha
esposa. Recebi inúmeras ameaças e, lamentavelmente, continuo a receber. Sigo
dormindo 4 horas por noite, sempre foi a minha média nos últimos 30 anos. E
continuo tomando também meu coquetel de vitaminas como faço há mais de 3
décadas.
UOL — O que a pandemia muda no cenário para 2020? Bolsonaro
tem condições de disputar a reeleição ou pode não terminar o mandato? O que é
mais provável hoje? O senhor participaria de uma frente ampla contra Bolsonaro
aliado à esquerda, até com Lula?
Doria — Não penso nisso agora. Não é hora de política e
muito menos de eleição. Temos que estar dedicados a um só propósito neste
momento: salvar vidas.
UOL — Como está a articulação dos governadores para uma ação
conjunta em defesa do isolamento social diante da ofensiva de Bolsonaro para
acabar com a quarentena no momneto em que se aproxima a fase mais aguda da
pandemia?
Doria — A maioria dos governadores tem agido corretamente e
mantido a quarentena e isolamento social, com a suspensão do comércio, das
aulas e de serviços não essenciais. Saberemos resistir às pressões e fazer o
que é correto para proteger as pessoas.
UOL — O que todo mundo se pergunta hoje é quando poderemos
voltar a uma vida normal sem colocar em risco o combate à pandemia. Qual é a sua
previsão?
Doria — Não fazemos a quarentena por vontade, fazemos por
necessidade. Infelizmente não tenho esta resposta e seria leviano da minha
parte dar uma data com precisão. Quem vai nos dizer isso serão os 15 médicos
especialistas que formam o Comitê Médico que integra o Centro de Contingência
do Covid-19 em São Paulo. Eles acompanham dia a dia o cenário e a evolução da
doença no nosso Estado. Hoje meu maior desejo é chegar o dia em que vou poder
anunciar o fim do isolamento e a volta da rotina normal.
UOL — Esta semana o senhor não voltou a falar em punição aos
que desobedecerem a quarentena. São Paulo ainda corre o risco de um lockdown, o
confinamento obrigatório?
DO UOL com o Politika

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